19/03/2024

Geração Z: inserção no mercado de trabalho e adaptação das empresas

Segundo Joaquim Santini, é preciso que as empresas adaptem suas gestões para que os profissionais da Geração Z possam ser melhor absorvidos.
Conversamos sobre a Geração Z com Joaquim Santini, pesquisador, consultor internacional e CEO da EXO Excelência Organizacional. Segundo Santini, a Geração Z é formada pelas pessoas nascidas entre 1995 e 2010.
Como você avalia a inserção da Geração Z no mercado de trabalho?
A Geração Z é tecnologicamente excelente, adora navegar na rede e nas diversas mídias sociais, adora a diversidade, que é a inclusão das minorias, e reivindica muito a sustentabilidade do planeta e os movimentos sociais. Como ela nasceu nessa era tecnológica, a tecnologia é parte integrante do seu desenvolvimento humano.
O contraponto de tudo isso, que é o lado mais dark side que pouca gente fala, é que eles são mimados, possuem problemas em processos intrapsíquicos razoavelmente complicados e tendem a ficar muito em confinamento. Eles têm um monte de redes de relacionamento, mas os vínculos que criam são muito frágeis. Antigamente, os vínculos eram feitos pelo relacionamento por contato, mas como o relacionamento da Geração Z é virtual, eles não têm esse tipo de vincularidade emocional.
Contudo, quando se fala da Geração Z é preciso tomar um certo cuidado, pois existe a Geração Z das classes mais baixas e média-baixa e a Geração Z das classes média-média, média-alta e alta. Ou seja, quando se fala da Faria Lima, é uma coisa, mas quando falamos, por exemplo, do interior do Mato Grosso do Sul, é um pouco diferente. Em termos de tecnologia, eles são mais ou menos parecidos, mas a dependência em relação ao emprego é outra.
A Geração Z das classes mais baixas e da média-baixa precisa se empregar, enquanto a Geração Z das classes média-média, média-alta e alta tem uma baixa lealdade com as empresas nas quais trabalham. Eles trocam de emprego com mais facilidade e têm muitas dificuldades em aceitar críticas, pois gostam de likes, de ser o spotlight e de estar no front do que está acontecendo.
O que está acontecendo hoje é um choque de gerações. Algumas empresas estão chamando de volta profissionais mais velhos para ocuparem, até certo ponto, o espaço da Geração Z. A questão é que a Geração Z veio para ficar. Sem contar que depois dela está vindo a Alfa, que está sendo gerada com muito mais tecnologia e muito mais ligada nas redes sociais. Quando uma empresa chama de volta profissionais mais velhos, ela está implementando uma solução de curtíssimo prazo, pois se ela não mudar a forma como é feita a sua gestão, ela vai fazer isso até quando?
As empresas estão em transição, mas vão ter que criar sistemas para se adaptarem a Geração Z, que está pedindo espaço. É preciso linkar propósito no que eles fazem, explicando a proposta e os porquês, já que não se vai mais na base do “vamos que vamos”. É por isso que as organizações estão sofrendo muito, pois elas não conseguem olhar para dentro de si mesmas e ver que não há como brigar com a realidade.
O sistema atual quer pegar a Geração Z e colocá-la dentro dos seus moldes. Isso não vai dar certo, pois tem muita gente chegando. O que as organizações precisam discutir é o que vai mudar internamente para que elas consigam, adequadamente e simultaneamente, adaptar a Geração Z e a empresa. Parte do que a Geração Z está pedindo, a força de trabalho mais antiga também pede: autonomia. A Geração Z quer ver os projetos serem implantados e querem velocidade nessa implantação.
Por exemplo, em uma determinada empresa média, com faturamento anual de R$ 200 milhões, eu entrevistei três pessoas da Geração Z que me disseram que não conseguiam implantar os projetos, pois os mais velhos resistiam às suas ideias, mas reconheciam que o dono da empresa, que tem 42 anos, estava com eles e acolhia muito as suas ideias, criando muitos contrapontos em relação ao pessoal das antigas, que ele também precisa para garantir a competitividade da empresa. Não era fazer uma escolha entre a Geração Z e o pessoal das antigas, mas fazer um match para que o mix funcionasse minimamente. Vai ter tensão? Vai. Vai ter conflito? Vai, mas é preciso administrar essas situações.
Para que se faça essa administração, é preciso criar um sistema de confiança dentro da organização, colocando a Geração Z e o pessoal das antigas para se entenderem e compartilharem ideias, de forma a que eles se alinhem e criem uma rota de convivência pacífica, pois, acima de tudo, a pergunta que precisa ser feita é o motivo de todos estarem ali, que é ajudar a empresa a ter um bom desempenho, se posicionar no mercado e crescer.
Eu foco no lado das empresas porque elas deixam muito a desejar, pois a leitura de muitos executivos é polarizada. Eles não são transdisciplinares. É muito difícil você encontrar um executivo que tenha lido alguma coisa de sociologia, antropologia e filosofia. Isso faz com que muitos não tenham flexibilidade mental para atender a demanda de um mercado que está passando por toda essa turbulência. Isso porque existem coisas muito mais complicadas que a Geração Z. A sociedade está muito líquida, e a Geração Z vem com essa fluidez, com as relações ficando cada vez menos vinculares em termos emocionais. Tudo isso tem impacto nas empresas.
Como você vê a mão de obra composta pela Geração Z que está chegando ao mercado de trabalho?
Eu tenho duas pessoas da Geração Z que trabalham comigo. Todas as imagens que colocamos numa apresentação são por meio de inteligência artificial. Não há um texto que tenhamos produzido que não tenha passado por algum robô de inteligência artificial. Comparando o que somos hoje com o que éramos antes, em termos de produção nós tivemos um salto quântico nos relatórios técnicos, conteúdo técnico e análise técnica.
Nós somos de uma época que era tocada na base do “se vira”. É preciso tanto dedo para lidar com os profissionais da Geração Z?
Uma questão chave dessa geração é que eles lidam muito menos com a frustração. Nós fomos muito mais resilientes, pois aprendemos na base da pancada. Como tínhamos que nos virar, ficamos um tanto casca-grossa. Hoje, a Geração Z é mais pele-fina. Eu digo isso, mas eu não sei como ela vai estar daqui a um ano.
Como a Geração Z tem muito menos capacidade intrapsíquica para lidar com as frustrações, ela simplesmente deleta da rede a pessoa que a criticou. Além de terem menos capacidade para lidar com as frustrações e de não gostarem de ser criticados, eles querem feedback instantâneo, e não mais anual, mas só se for positivo, legal, pois se for negativo, você tem que saber falar, senão eles ficam melindrados.
Nós estamos num momento em que ainda não existem muitas soluções, pois elas estão sendo criadas. Quem diz que tem uma boa experiência nesse tema, está mentindo. Por exemplo, com relação à Geração Alfa, nós vamos ter que esperar para aprendermos, o tal do  learning by experience.
Agora, o processo de desenvolvimento humano da Geração Z, desde o nascimento, está fortemente atravessado pela cultura do espetáculo e do narcisismo que está acontecendo na sociedade. As redes sociais apregoam uma vida que não existe. Ninguém vai ter três iates, quatro Ferraris e um corpo trincado. Tudo isso é uma certa ilusão, uma coisa fantasiosa. A fugacidade está muito alta, e essa Geração Z é fugaz.
O que as empresas deveriam fazer para lidar com a Geração Z?
Em termos de gestão, a forma como os líderes empresariais foram educados e desenvolvidos contempla o comando e o controle. É fazer plano de ação, monitorá-lo e saber se deu certo ou errado. Na minha opinião, a mudança do mindset é para que se tenha lateralidade. A mentalidade vai ter que mudar. Não existe mais organograma, pois está tudo conectado em rede. Ou a pessoa consegue ser um líder que gera ressonância na sua rede ou não vai ter chance. As empresas mais inteligentes já estão nesse movimento.
É preciso dar empowerment para a força de trabalho, mas com responsabilidade, ou seja, com um sistema de consequência junto. Comando e controle é fácil, mas o novo modelo preconiza muita conversa, transparência, vitalidade e energia. Não é um líder carismático, mas um líder que queira desenvolver as pessoas. Com isso, você muda uma empresa.
Como você está vendo a perspectiva da Geração Z em cargos de chefia?
Eu conheço duas moças da Geração Z que já são gerentes, num nível intermediário de gestão. Quando elas recebem um problema, elas perguntam à pessoa que o levou como elas podem ajudá-la a resolvê-lo, mas não resolvem o problema nem a pau. Outro ponto é que quando as suas empresas quiseram voltar com o trabalho presencial full-time, elas disseram que iam continuar no trabalho híbrido, caso contrário sairiam.
Eu vejo elas como líderes com uma lateralidade maior do que muitos executivos mais antigos. Eu estou falando da lateralidade porque, infelizmente, se ela não for aumentada, não vai.   (Joaquim Santini - Monitor Mercantil)

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